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Francisco Jesus

FACULDADE, E DEPOIS DE TI? – PARTE III


NOTA DO AUTOR:


Com esta terceira parte, concluo o que foi o meu Trabalho Criativo da disciplina de Introdução ao Direito e ao Pensamento Jurídico. Deixei a minha favorita para o final: a entrevista à Dra. Ana Margarida Santos, Senior Partner da própria firma, e que foi, até recentemente, Conselheira na Superior da Ordem dos Advogados. Especialista na área de Direito Fiscal, (quase) sempre trabalhou com instituições bancárias. Considero esta a minha entrevista favorita uma vez que esta senhora é uma pessoa que admiro muito, que sempre esteve disponível para o que precisei e que já tive o privilégio de ver defender os seus clientes e as suas causas. Assim sendo, o último agradecimento é para esta incrível profissional, que nos deixa entrar um pouco no seu mundo, não deixando de fora nem o bom, nem o mau. 

FJ: Olá Doutora. Em primeiro lugar queria agradecer-lhe por ter aceitado o meu convite. A primeira pergunta que tenho para lhe fazer é a seguinte: Licenciou-se na Faculdade de Direito da Universidade Lusíada de Lisboa. Como foi a sua experiência enquanto estudante?


Ana Margarida Santos (AMS): Eu é que agradeço o convite. Dos três aos quinze anos, andei num colégio, a Academia de Música de Santa Cecília. Ora, como pode imaginar, nada conhecia da vida. Quando aos quinze, passei para um liceu, o Liceu Rainha D. Leonor e, aí, só fiz disparates. Tanto que só fiz disparates que não consegui ter média para as melhores faculdades de Direito na altura, a FDL e a Católica. Assim, acabei na Universidade Lusíada de Lisboa. Chumbei 2 anos, e saí do curso a sentir que não sabia absolutamente nada. Era um curso extremamente teórico, sem nunca sequer me ensinarem como fazer um requerimento, uma petição inicial, nada. Nos dois últimos anos de curso, trabalhei como paquete num escritório, onde aí sim ganhei experiência. Fiz, após o curso, uma pós-graduação em Direito Fiscal no ISG. Isto em 1995.



FJ: Após esta pós-graduação, começou o estágio, correto?


AMS: Exatamente. Fiz um estágio com um patrono, um amigo do meu pai, mas logo me fartei e, por isso, pedi ajuda a uma amiga, para trabalhar com ela. Na altura, ganhava 30 contos por mês, o que me dava apenas para o combustível no meu carro. Eram 5 advogados que geriam o escritório. Ao fim de um ano, já estava a receber 500 contos, mas dormia 6 horas por dia. A dada altura, este conjunto de 5 advogados transformam-se numa sociedade, e fazem-me uma proposta para ser sua associada. Eu recusei, e decidi abrir a minha própria firma, com uma amiga e uma solicitadora.



FJ: Como foi este processo de abertura de firma? É a firma onde estamos agora?


AMS: Não, não é. Estamos a falar de 1998, firma onde estamos agora foi aberta em 2005. Em primeiro lugar, deixe-me que lhe diga que o mais difícil na nossa profissão é que temos duas opções: ou vamos trabalhar para uma sociedade, ou abrimos a nossa, e aí a principal dificuldade é arranjar clientes. Não havia clientes. Assim, quando um amigo do meu pai me oferece um trabalho de solicitadoria, disse que sim, apesar de que 90% das pessoas teriam dito que não. Aí sim comecei a gostar da gestão da advocacia. Fiz de tudo, registos nas conservatórias, entrega de distrates, entre outros.



FJ: Ora mas após esta “pausa” na advocacia, começou a trabalhar com instituições bancárias, certo?


AMS: Certo. Em 1999, foi me proposta uma avença no banco com três processos judiciais, a qual eu aceitei, e um ano depois fui convidada para ficar como advogada nesse banco, que na altura já era um banco internacional. Tinha cerca de dez mil processos. Passado um tempo, começo a ter avenças com outras empresas. A equipa começa a crescer e em 2003 sou convidada para restruturar o departamento de desinvestimento (os imóveis que o banco revende) do banco onde estava. Tivemos que pegar em todos os imóveis, e analisá-los um a um. Em novembro de 2004, fui eu que organizei o primeiro leilão imobiliário através da banca em Portugal. Um ano depois, criei uma sociedade com o meu ex-marido e outra colega, sendo eu a principal sócia. Esta sim, a firma onde estamos agora. Tínhamos cerca de 12 colaboradores.


AMS: Em 2007, a convite do presidente de um outro banco, crio um departamento de desinvestimento nesse banco, com outras 6 pessoas. Nesse mesmo ano, tenho um esgotamento, um burnout, algo tão comum entre os advogados e, por exemplo, os gestores. Tive de ficar de baixa durante 3 meses, e quando informei alguns colegas nos bancos, um pouco recetiva e tímida, o que me disseram foi: “Que sintomas tiveste? Ando a sentir umas coisas esquisitas.”, o que mostra o quão frequentes são estes acontecimentos. Após estes 3 meses, não consegui recuperar, e, portanto, fui para a Galiza 15 dias sozinha, para longe dos meus filhos, e só aí melhorei. Passados dois anos, em 2009, divorcio-me. Termina-se a sociedade, ficando só eu, e apercebo-me que o meu ex-marido me deixou cheia de dívidas. Voltei à estaca zero. Isto coincide com a crise do Subprime, pelo que volto a trabalhar muito com a banca, mas os meus principais clientes agora tinham falido.


AMS: Mais um ano se passa, e em 2010, recebo outra proposta, de um terceiro banco, onde fiquei cerca de 3 anos. Note que nunca deixei os outros, portanto nesta altura trabalhava com 3 instituições bancárias. Em 2012, mais um banco me faz uma proposta, um dos com que me mantenho até hoje. Não chego a trabalhar com 4 bancos em simultâneo, uma vez que um dos bancos anteriores começa a pedir-nos para cometer umas irregularidades, algo com que não compactuei, e, portanto, larguei-o.



FJ: Ora mas porquê o caminho pela própria sociedade? Não era convidada para as grandes sociedades?


AMS: Era sim. Tive inúmeras propostas para grandes sociedades. Nunca quis. Atualmente, os clientes procuram um atendimento personalizado, um advogado que esteja lá para o cliente no matter what. Não querendo dizer que nas grandes sociedades isso não acontece, mas é mais difícil termos um atendimento perso-nalizado quando contratamos uma firma com centenas de colaboradores. O outro problema das grandes sociedades é que quando lá trabalhas, aquilo é como uma máquina, uma linha de montagem. Ou acompanhas, ou és engolido pela máquina.



FJ: Para além de ser advogada, é Conselheira no Conselho Superior da Ordem dos Advogados. Em que consiste este órgão?


AMS: Exato. Desde 2020, sou conselheira do Conselho Superior da Ordem dos Advogados, sendo que o meu mandato termina este ano. O Conselho Superior é basicamente o órgão máximo jurisdicional da Ordem. Comparado ao Estado, seria como o Tribunal Consti-tucional da Ordem dos Advogados. Decidimos recursos a processos deontológicos, assim como processos de laudo – que são análises técnicas dos honorários dos advogados.



FJ: Chegamos então ao fim desta entrevista. Que conversa esclarecedora! Muitíssimo obrigado.


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