top of page
António Subtil

Faz todo o sentido


O surrealismo literário possui deveras potencial temático, dado eu poder escrever:


“Hoje olhei para o céu e a Lua estava amarela, o que me indica que virou queijo ou, mais provável, esfolou a pele ao pai Sol Ámon-Rá por amor, ódio e inveja, mas se lhe pegares no cantinho e arrancares, ela esborra as pedras lunares juntos com os sete rins, cinco braços, três pianos a mais e nenhum cérebro, e quando te afogares nas suas vísceras desidratas-te que estás no deserto com as pirâmides de Gizé a mostrarem os dentes e a rirem-se da tua cara, cara com a qual lhes dás um pontapé, mas as gargalhadas não param mesmo porque nunca param, e dizem «Nós matámos demasiados dias para que não nos sejas verme» e viras mesmo verme, feito arqueólogo pelos cadáveres colossais que morrem melhor que tu vives, e passaram-se 7117 dias e ainda não encontraste o mijo dourado dos Faraós, deixaram-te pó, aquele Ozymerdas, porque nunca vais encontrar, sejamos honestos, não te enfiaram nos dentes ouro nem picaretas nem canetas nem afeto, não esperes receber nada do Nilo ou da Amazónia, e vai ver agora como ela arde, como um fogo que arde mas bem se vê, há gajos mesmo cegos mas chamam-se poetas na mesma, o teu peito não consegue respirar o ar das vacas que manjam nos olhos, orelhas e lábios dos índios e cagam Reais de carne, e atira-te à água que não é aqui que te vais afogar, e sentes o sal do rio a encher-te os pulmões até saber a bacalhau, porque estás no jantar de Natal e há oito nortenhos a olhar para ti, e depois olhar para a Estrela cadente de David que corre desde galáxia Andrómeda até à galáxia Eu Nunca Percebi Nada de Ciências o Que é uma Pena Porque Dizem que Pagam Melhor e São Mais Felizes, olham para ela, e para ti, para ela e para ti, para ela e para ti, e tu dás-lhes oito tiros com a motosserra que ficam todos vesgos e conseguem olhar para ela para ti ao mesmo tempo, e aí pedem o seu desejo; o desejo é que o David te caia em cima e te foda, mas os cornos e não o cu, e queres comer o peru e beber o binho e a cerbeja e o sangue das beias de cima, mais o bómito que há de aparecer porque tudo é bómito quando se está à mesa não é mesmo, devorar tudo até virares Ouroboros Azteca que consome o Sol que começou esta lengalenga toda não é verdade, portanto bem vistas as coisas a culpa é da vela não é, digam que é, ou fiquem mudos que tu também és surdo, mas até Sócrates sabe que a culpa é da vela que te acendeu portanto mais vale coser de volta e enfiar os bebés nos raios solares e dizer aos senhores doutores «Lamento mas Isto não está bom para existir, nunca esteve, nunca estará, não damos consentimento, nem batizamos, muito menos oramos, queimem e deitem abaixo esta Cruz.”


E você pergunta-se “O que é que acabei de ler? O que é que significa?”, e eu posso-me a si agachar, estender os braços por detrás das costas e coração, colocar os lábios ao ouvido, e sussurrar:


“Não digo, fode-te.”


59 views

Recent Posts

See All

Lápide

Comments


bottom of page