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Maria Leonor Simão

Lu & Gomitas

(Esta carta é resultado de profunda manipulação emocional ocorrida em território espanhol mediante queixas de insuficientes discursos acerca das minhas melhores amigas no meu aniversário. Portanto aqui está, de forma ainda mais pública do que a que ocorreu na minha garagem acompanhada de bolo de chocolate, a minha grande declaração de amor).


Lu e Gomitas,

Há uma cena no fim do “Harry Potter: a Pedra Filosofal”, em que o Harry está a sair de Hogwarts e diz que não está a voltar para casa, não verdadeiramente. Eu - fã a um nível pouco saudável da saga - penso muitas vezes nessa cena quando penso em vocês. Cheguei a Lisboa há três anos, sozinha, no auge da minha condição de estudante deslocada, meio desamparada e com o meu pequeno coração a agarrar-se à esperança de encontrar algo, alguém, que o acolhesse e o protegesse. E o que eu encontrei – através de nada mais nada menos do que uma marosca para fazer as leituras de IDPJ – foram duas miúdas que mais do que acolher e proteger, lhe deram uma nova casa. Sinto-me um pouco como o Harry sempre que me despeço de vocês – e sabemos bem o quão frequente isso é, porque “lá vai ela para a Covilhã” – já que sinto sempre que, ainda que esteja a voltar a casa, ao mesmo tempo me afasto de uma outra que entretanto encontrei. Não há palavras que possam explicá-lo nem discursos que alguma vez sentirei serem suficientes para vocês as duas - o vocabulário português, ainda que imensamente bonito, não contém as palavras necessárias para explicar o quão casa vocês são; para falar dessa casa tudo parece pouco, tudo parece fabricado, e vocês merecem a magia do real – aquela que só se sente com um abraço, um olhar, ou um sorriso – palavras para quê?


De uma maneira ou de outra, se eu tivesse de escolher de entre as palavras, escolheria para vocês a palavra “saudade”. Enquanto seres humanos invariavelmente condenados à tristeza, nós não costumamos associar a palavra saudade a bons sentimentos. Costumamos associá-la a sofrimento, e a vazio, e a luto. Mas vocês não são esse tipo de saudade. Vocês são a saudade que se sente quando estamos à mesa de um café e nos apercebemos de que o tempo que temos com as pessoas com quem estamos sentados é finito. São a saudade de uma noite longa com bochechas rosadas e olhos brilhantes e muita música. São a saudade de uma troca de olhares cúmplice que não exige uma pergunta. São a saudade de andar pelas ruas de braço dado e de chamadas noturnas sem minutos. São a saudade de rir até doer a barriga e de falar até o sol nascer.


Vocês são a saudade de tudo o que passou, a saudade de tudo o que agora há, a saudade de tudo o que ainda virá. São o desejo do para sempre, o antónimo da efemeridade; a completude do tudo, a negação do nunca. São a saudade de casa.


Se houver um bom tipo de saudade - aquele tipo de saudade que sentimos num pôr do sol de fim de verão - vocês são a sua materialização. E eu sei - o Harry Potter ensinou-me - que toda essa saudade, que é só amor em forma de balão de ar quente, faz com que vocês nunca me deixem, com que estejam sempre comigo. A vossa presença na minha vida é astronómica e é completamente inconcebível para mim existir sem vocês, que se alojaram irreversivelmente em todas as partes de mim que são melhores por vossa causa.


Por isso, mesmo que eu tenha falhado catastroficamente no discurso de garagem, e mesmo que não o diga tanto quanto devia, eu espero que vocês saibam o quão inumanamente feliz eu sou diariamente por poder ter o privilégio de vos encontrar em áudios de 8 minutos, na minha caneca favorita, em qualquer comida sem queijo, em conversas com os meus pais, na paz do mar e na serenidade das montanhas, em sombras de olhos brilhantes, em chamadas recentes do atendedor, em reclamações matinais, e em todas as conversas sérias e menos sérias, confianças e inseguranças, sentimentos confusos e claros e memórias exponencialmente mais caóticas e bonitas e inesquecíveis por serem completamente nossas e que vão existir indefinidamente no universo - porque o amor nunca morre, espalha-se pelas estrelas que são tuas, Leonor, e reflete-se na tua lua, Luana.


Falham-me de novo as palavras, por isso manter-me-ei por algo simples: gosto mais de vocês do que de Harry Potter. E se isso não for suficiente, então acrescentarei: eu abdicaria de toda a magia do mundo em troca de uma vida de muggle em que vocês estivessem sempre comigo. Porque, na verdade, eu experiencio magia todos os dias, então sei que ela existe. Sei que tenho a sorte de ser um terço de uma amizade mágica. De um amor universalmente mágico que me faz sentir saudades vossas mesmo quando estão pertinho de mim. E deixem-me que vos diga: que universo tão real e perfeito (afinal é possível) em que existe magia no mundo, e essa magia são vocês.



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