top of page
Francisco Jesus

Os Estudantes disseram não, mas...

Começa um novo semestre letivo nas Universidades. Neste novo semestre, os alunos do ensino superior, já desgastados, já de bolsos rotos e carteiras vazias, deparam-se agora com mais obstáculos e maiores dificuldades.

            Chego à Faculdade, e deparo-me com um Bar que, apesar de recentemente ter passado a ser explorado pelos Serviços de Ação Social da UNL (SASNOVA) – o que implica preços sociais e mais baratos, subiu transversalmente os seus preços, tal como outros bares explorados pelos SASNOVA ao longo das diferentes Faculdades.

            No entanto, repetidamente se vê a tentativa de órgãos diretivos da Universidade em alargar este aumento de preços a todas as áreas de atuação dos SASNOVA.

Não é segredo nenhum que o Reitor e a Universidade NOVA de Lisboa têm sucessivamente tentado implementar este aumento de preços, o que se pode ver, por exemplo, no aumento de preços na Residência Universitária Alfredo de Sousa, também gerida pela mesma entidade. A novidade é a mudança do sentido de voto dos órgãos que têm algo a dizer nestas matérias, seja de forma figurativa ou vinculativa. Falo nomeadamente nos órgãos que compõem o Conselho de Estudantes da UNL (CE) – as e os presidentes de todas as Associações de Estudantes, a Administradora dos SASNOVA e o Reitor da UNL.

            No dia 8 de janeiro de 2023, é emitido um comunicado assinado por várias das associações que compõem este Conselho: AEFCT (Faculdade de Ciências e Tecnologias da UNL), NIMS SU (NOVA IMS), AENMS (NOVA Medical School) NLSU (Faculdade de Direito da UNL) e AEENSP (Escola Nacional de Saúde Pública), informando a todos os estudantes que no final do ano letivo passado, deu-se uma reunião de Conselho de Estudantes, em que a proposta de aumentar a refeição social para 3,00€, tal como já aconteceu, por exemplo, nas cantinas da Universidade de Lisboa, foi chumbada por todas as associações presentes. No comunicado, pode ler-se que as Associações “acreditam que este aumento é mais uma barreira à manutenção dos estudantes no Ensino Superior”. Acontece que, apesar do Conselho de Estudantes ser um órgão consultivo, a proposta foi chumbada em Conselho de Ação Social (CAS), órgão deliberativo, pela força das 2 estudantes que o compõem, contrapondo os seus votos contra o voto a favor da Administradora dos SASNOVA. Note-se que o Reitor João Saágua não compareceu a esta reunião, pelo que não votou.

            Ainda assim, no dia 7 de fevereiro de 2024, vem a público um comunicado da AEFCSH (Faculdade de Ciências Sociais e Humanas), onde se pode ler que após a convocação de uma nova reunião de Conselho de Estudantes da NOVA por parte dos Serviços de Ação Social, as Associações presentes aprovaram uma proposta que aumenta o preço do prato social, com um único voto contra, o da AEFCSH.

            Na sequência deste comunicado, vêm as associações emissoras do primeiro comunicado emitir um segundo, no dia 8 de fevereiro, que justifica esta votação pelo facto de que se viram obrigadas a negociar um aumento de preço que fosse menos radical que os 3,00€ por refeição, já que previam que a não negociação do preço levasse a uma aprovação por parte do CAS, previsivelmente com o voto contra das estudantes que o compõem, e com o voto a favor da Administradora dos SASNOVA e do Reitor, que neste caso possui voto de qualidade.

Apesar de haver mérito na atuação das Associações nesta primeira reunião de CE, e maior mérito ainda nas estudantes que pertencem ao CAS, não sou capaz de compreender dois pontos essenciais nesta atuação: o primeiro sendo a incoerência na atuação destas AE’s, especialmente as subscritoras do comunicado acima referido, e o segundo sendo conceber a possibilidade de haver Associações de Estudantes, o órgão que representa todos os Estudantes e, acima de tudo, os protege e lhes dá voz, a votar uma proposta que faz aumentar o esforço financeiro dos estudantes e das famílias a que pertencem.

Sobre a primeira questão levantada, tendo em conta que as decisões foram tomadas em anos letivos diferentes e ainda que o comunicado tenha sido publicado já no ano letivo subsequente, só podemos supor que serão mandatos diferentes, e que as motivações de cada Associação, mudam consoante a sua Direção e consoante a sua Presidência. Ainda assim, parece existir, no que toca ao primeiro comunicado, um certo aproveitamento de ações e mudanças conseguidas por mandatos anteriores, que são agora reivindicados pela nova direção em funções. Isto torna-se ainda mais visível quando existe agora uma mudança no que é a atuação e na posição das Associações em sede de Conselho de Estudantes.

Sobre o segundo ponto, não é admissível que uma Associação de Estudantes ponha à frente dos próprios estudantes a tentativa de lucro de um Serviço que não foi criado para dar lucro. Ainda que estas Associações afirmem que agiram da forma que agiram com o bem-estar dos estudantes em mente, não me parece que partamos do princípio certo se um órgão, que ainda por cima é meramente consultivo, não participando ativamente nesta decisão, que é da competência do CAS, abre a porta a estes ultimatos unilaterais por parte dos Serviços de Ação Social da Universidade. Acredito veementemente que é direito, mas também é dever, de questionar e responsabilizar as direções das Associações que agiram neste sentido. Sobre o segundo comunicado emitido, não é satisfatório mostrar que encontraram uma solução que é “o menor de dois males”, e afirmar que “os estudantes disseram não”. Os estudantes, de facto, dizem que não. Dizem que não nos corredores, quando se queixam dos preços. Dizem que não nas manifestações do Dia do Estudante e outras tantas. Dizem que não quando escrevem estes textos, e exigem mais e melhor das suas Associações. O que a NOVA Law SU e restantes Associações presentes em CE (à exceção da AEFCSH, cuja ação é de louvar) fizeram foi dizer “não, mas...”. Os Estudantes precisam de Associações fortes, que se batam e travem as suas posições e que não cedam no que toca aos seus direitos.

Não é admissível, face ao contexto socioeconómico e financeiro do país, onde há cada vez mais dificuldades e onde cada estudante sofre mais e mais com o peso financeiro do Ensino Superior, que os Serviços de Ação Social, criados para mitigar as desigualdades e proteger especialmente os mais desfavorecidos, procurem a cada oportunidade esmagar qualquer alívio que os estudantes possam ter, alívios esses que são dados por obrigação legal e pelas respetivas imposições de tetos máximos, o que também se vê, por exemplo, na propina de licenciatura ou mestrado integrado, que na grande maioria dos cursos corresponde sempre ao teto máximo imposto, ou nas propinas de mestrado e doutoramento, que por não terem teto máximo, veem-se duplicadas ou triplicadas face ao preço da licenciatura.

Claro está que estas tentativas hostis têm uma raiz comum: o subfinanciamento crónico do Ensino Superior e respetivo regime de financiamento, que se manifesta em todas as vertentes do ensino superior e que lhe são análogas: refeições sociais em cantinas universitárias, alojamento estudantil, entre outros, e que obriga os estudantes a suportar os seus próprios custos, não lhes permitindo estudar num ensino superior gratuito, e verdadeiramente livre ou, pior ainda, impedindo-os de o frequentar.

No ano em que o acontecimento mais importante da nossa democracia celebra o seu quinquagésimo aniversário, não podemos deixar descurar o que ele nos conquistou: entre outras coisas, a luta, a liberdade. Não esqueçamos também a luta estudantil, que começou antes do 25 de abril e que até hoje continua, pelos estudantes. Não nos contentamos pela

luta da conveniência, da cedência, sem substância. Não nos contentamos pelo “mal menor”.

43 views

Recent Posts

See All

Lápide

Comments


bottom of page