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Marta Pereira e Sofia Dias

Uma união (im)provável

Existe a narrativa comum de que grupos religiosos e grupos Queer são como cão e gato, que funcionam como polos opostos, não existindo quaisquer alianças entre os dois. O que o livro Queer and Religious Alliances In Family Law Politics And Beyond pretende, ambiciosamente, revelar, segundo Nausica Palazzo, uma das editoras e autoras da obra, é que tal narrativa poderá conter algumas falhas, alguns recantos escuros que são necessários iluminar.


O Jur.nal esteve presente no lançamento do livro que se realizou no dia 12 de junho, pelas 16 horas. No evento, participou a Professora Doutora Mariana França Gouveia, que nos elucidou sobre a importância da Nova School of Law promover e dar espaço a eventos como este. Para além disso, tivemos o prazer de ouvir os autores da obra: Jeffrey A. Redding, da Universidade de Melbourne; Nausica Palazzo, da Universidade NOVA de Lisboa; Robin Fretwell Wilson, da Universidade de Illinois; Noy Naaman, da Universidade de Toronto; Ayelet Blecher-Prigat, da Academic College of Law and Science e Laura Kessler, da Universidade de Utah. À discussão, juntou-se Ruth Halperin-Kaddari, da Universidade de Bar-Ilan e Adrienne Davis, da Universidade de Washington em St. Louis, ambas convidadas para comentarem o projeto.


Segundo Palazzo, o livro apresenta a possibilidade de grupos conservadores religiosos e grupos progressistas poderem trabalhar em conjunto para expandir o reconhecimento do Direito da Família para além da família tradicional, “patrocinada” pelo Estado. Salientou que vários grupos religiosos demonstram interesse em promover estruturas familiares alternativas. Por exemplo, certas comunidades muçulmanas e mórmons ao defenderem a poligamia vão de encontro com o interesse de grupos Queer em superar a incorporação da monogamia na lei estadual. Para além disso, o anseio de conservadores religiosos norte-americanos por reformas em favor de famílias não conjugais e contra o casamento entre pessoas do mesmo sexo coincidem, também, com certos esforços queer, destinados a legitimar amizades e famílias que se distanciam da dita “tradicional”.


Jeffrey Reading mencionou o facto de o livro levantar questões cruciais no que toca a política queer, ligadas aos principais desenvolvimentos da matéria em questão, ocorridos nos Estados Unidos, na Índia e noutros países.


Cada um dos autores procedeu a uma pequena apresentação do capítulo que redigiu. Robin Wilson argumentou contra a separação do Casamento do Estado, sustentando-se no desenvolvimento da legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo nos Estados Unidos. Já Noy Naaman e Ayelet Blecher-Prigat sustentaram o contrário, tendo por base do seu estudo Israel, defenderam a abolição do casamento civil como um projeto queer e religioso, crendo que só assim é que os dois grupos beneficiavam. Laura Kessler propôs algo igualmente provocante: a ideia de conseguir igualdade sem a existência necessária de uma Constituição. Kessler revelou que, no livro, aborda a possibilidade de desenvolver uma pluralidade de respostas que vêm acompanhadas de legislação eficaz para proteger grupos Queer, sem a necessidade da existência de uma Lei Fundamental.


Reading abordou, ainda, o facto de o livro ser, pelas palavras de Laura Kessler, um “pandemic baby”. As formas com os autores exploravam os assuntos mudaram com o confinamento, dando-lhe novas perspetivas acerca das relações interpessoais que estudavam. Por outro lado, também revelou a complexidade do processo de edição da obra, já que, ao ter vários autores, era difícil conseguir uma linguagem consistente ao longo do projeto, nomeadamente no que toca à nomenclatura que utilizaram para falar nos diferentes grupos sociais objetos de estudo.


Questionada acerca de quais os temas que poderiam ter sido deixados de lado, para dar espaço a uma investigação mais detalhada em certos ramos, Nausica Palazzo afirmou que ainda há muito por onde explorar, conectando a questão, por exemplo, ao Direito dos Contratos. O importante, realçou, é que se construiu um vocabulário essencial para se falar sobre estas questões, pronto a ser utilizado, quem sabe, até noutro livro.


Afastando-se das narrativas dominantes das chamadas “culture wars”, o livro é oportuno para o entendimento de uma problemática em constante mudança. Esta não é apenas uma questão de juristas, mas de Direitos Humanos, tal como os oradores o conseguiram transmitir, pelas suas áreas de estudo e diferentes opiniões, oferecendo ideias cruciais para o entendimento da problemática em questão.


Demais, o jur.nal felicita esta iniciativa pioneira da parte da Professora Nausica Palazzo e dos autores e espera continuar a acompanhar este projeto, alusivo a um assunto assaz relevante.




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